A razão pela qual algumas pessoas não foram infectadas pelo vírus causador da covid no período de mais de dois anos da pandemia intriga os cientistas. Pesquisadores da Universidade de Oxford investigaram como os genes podem influenciar na resposta imune do corpo e podem ter descoberto informações importantes para solucionar essa dúvida.
As descobertas foram publicadas na revista científica Nature Medicine no dia 13 de outubro e apontam para um gene que ajuda a gerar uma reação imunológica mais forte após as duas doses da vacina contra a covid-19 serem administradas. As pessoas que tinham o HLA-DQB1*06, uma variação do gene HLA (do inglês Human Leukocyte Antigen), tiveram uma resposta de anticorpos mais alta que as que não tem o gene.
Menos propensão
No Reino Unido, duas em cada cinco pessoas têm esse alelo, e os cientistas chegaram à conclusão de que elas são menos propensas a serem infectadas pelo SARS-CoV-2 depois de terem sido vacinadas do que as demais. Isso se daria porque o gene HLA ajuda o sistema imunológico a distinguir as proteínas do próprio corpo das proteínas que são produzidas por vírus e bactérias.
A pesquisa traz evidências de que fatores genéticos podem fazer com que o sistema imunológico responda às vacinas contra a covid-19 de formas diferentes em pessoas diferentes, mas suas aplicações clínicas ainda não são claras.
“É necessário mais trabalho para entender melhor o significado clínico dessa associação e, de forma mais ampla, o que identificar essa variante genética pode nos dizer sobre como as respostas imunes eficazes são geradas e como continuar a melhorar as vacinas para todas as pessoas”, disse em um comunicado Julian Knight, pesquisador-chefe do estudo e professor de medicina genômica no Centro Wellcome de Genética Humana da universidade.
O estudo
Ao longo da pesquisa, os pesquisadores de Oxford analisaram amostras de DNA de 1.190 pessoas que se inscreveram para os ensaios clínicos da vacina de covid-19 da universidade; de 1.677 adultos que faziam parte do estudo que analisava as opções de segunda dose para quem havia recebido os imunizantes Oxford-AstraZeneca ou Pfizer-BioNTech como primeira dose; e também de crianças que participaram de ensaios clínicos da vacina Oxford-AstraZeneca.
Os indivíduos que carregavam o gene HLA-DQB1*06 apresentaram respostas mais altas de anticorpos 28 dias após a primeira vacina, e eram mais propensos a essa reação imune mais acentuada a qualquer momento após a vacinação.
Depois de um acompanhamento de 494 dias, os cientistas descobriram que, enquanto o HLA-DQB1*06 estava presente em cerca de um terço das pessoas que apresentaram sintomas de covid-19, ele estava em 46% dos indivíduos que não relataram sintomas.
Em outras partes do mundo, cientistas também estão tentando entender como a genética pode explicar que algumas pessoas estejam mais protegidas contra a covid-19 que as outras, o que pode significar que o mesmo seja verdade para outras doenças e ajudar no desenvolvimento de novas vacinas e medicamentos.
No Centro de Estudos do Genoma Humano e Células-Tronco (CEGH-CEL) da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp), pesquisadores analisaram os dados de idosos com mais de 90 anos que se recuperaram da doença com sintomas leves ou que permaneceram assintomáticos após teste positivo para o novo coronavírus.
A análise indicou que os que tiveram covid leve apresentavam mais variantes do gene MUC22, ligado à produção de muco e lubrificação das vias respiratórias, o que pode significar que o gene reduz a resposta imune ativa contra o vírus enquanto protege as vias respiratórias, aumentando a resistência do indivíduo.
Cientistas da Fapesp também identificaram que a maior quantidade de um alelo do gene HLA-DOB pode estar relacionada a um agravamento da infecção. Esse gene tem maior ocorrência em pessoas africanas e sul-americanas e pode interferir na passagem de antígenos do vírus para a superfície celular, o que altera a capacidade do sistema imunológico de identificar esses antígenos e provocar uma resposta a eles.